Durante a maior parte da história da humanidade a mulher esteve em um papel coadjuvante, ficando sempre à sombra dos interesses do homem. Desde os primórdios da civilização, há a perpetuação do poder masculino, por meio do Direito, dos costumes, da cultura, que durante muito tempo legitimou a posição inferior tanto social quanto política da mulher.
Rosseau, que tanto contribuiu para a compreensão do Estado Moderno, defendia que a mulher deveria ser colocada a serviço do homem desde a infância até a idade adulta, isto é, que nunca deveria ter participação em construções sociais e políticas.
A mulher Atheniense, por exemplo, tinha autoridade inferior a do homem, dos filhos, do filho mais velho, enviuvando, ficava sob a orientação de um tutor, no lar tinha um relevante papel administrando-o , cuidando dos filhos e participava do culto familiar, sendo propriedade privada do homem, não tendo liberdade de ir e vir em público.
A mulher Espartana quando menina, embora permanecesse em casa, quando o irmão ia para escola militar de cidadania era lhe permitido praticar atividades atléticas vigorosas a fim de fortalecer-se fisicamente e tornar mais fácil sua maternidade posterior.
Na Idade Média a maioria das idéias e dos conceitos era elaborada pelos eclesiásticos que possuíam acerca da mulher uma visão de desconfiança, elas eram consideradas pelo clero como criaturas débeis e suscetíveis às tentações do diabo, logo, deveriam estar sempre sob a tutela masculina.
Na época Renascentista, a mulher se mantinha confinada ao lar, cumprindo sua vocação de esposa e mãe arraigada pela Igreja e sociedade. Até mesmo com as Revoluções Francesa e Americana, que deram origem à Idade das Luzes, as mulheres continuaram tendo sua participação vetada nos campos que não eram domésticos, os filósofos iluministas enfocam constantemente as diferenças fisiológicas e intelectuais que separam radicalmente os dois sexos. Para eles, homem e mulher são seres complementares, mas, nesta relação de complementaridade, os homens manifestam-se superiores às mulheres. Assim, no homem, domina a razão; na mulher, predomina o útero, que define a sua personalidade, toda a sua maneira de ser, pensar e agir.
A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, inspirada na Revolução Americana (1776) e nas idéias filosóficas do Iluminismo, aprovada pela Assembléia Nacional Constituinte da França em 26 de agosto de 1789, foi uma das cartas pioneiras na conquista de liberdades individuais, reconhecia o homem, em sentido genérico, como cidadão e sujeito de direitos. Na tentativa de incluir as mulheres como sujeito de direitos na Declaração elaborada em 1789, Olympe de Gouges, uma mulher revolucionária desafiou a conduta injusta da autoridade masculina e da relação homem-mulher, ela escreveu a Declaração dos Direitos da Mulher em 1791, devido aos escritos e atitudes pioneiras, foi executada na guilhotina em 1793.
Na segunda metade do século XVIII, com a Revolução Industrial a absorção do trabalho feminino pelas indústrias, como forma de baratear os salários, inseriu definitivamente a mulher na produção. Ela passou a ser obrigada a cumprir jornadas de até 17 horas de trabalho em condições insalubres e submetidas a espancamentos e humilhações, além de receber salários até 60% menores que os dos homens.
As manifestações operárias surgiram na Europa e nos Estados Unidos, tendo como principal reivindicação a redução da jornada de trabalho para 8 horas diárias. Em 1819, depois de um enfrentamento em que a polícia atirou contra os trabalhadores, a Inglaterra aprovou a lei que reduzia para 12 horas o trabalho das mulheres e dos menores entre 9 e 16 anos. O Dia Internacional da Mulher, 8 de março , foi proclamado no contexto dessa luta, devido à greve feita pelas funcionárias de Nova Iorque, em 1857, que culminou em uma abominável massacre contra 129 operárias, que foram queimadas vivas em uma indústria têxtil.
Com as mulheres engajadas nessas causas, muitas conquistas vieram e as poucos a classe feminina foi conquistando mais espaço, provando competência e força de trabalho. A cada geração as mulheres ficam mais independentes e, mesmo sem grupos organizados, as conquistas continuam. Mais do que uma luta pessoal, as mulheres com consciência do poder da classe também estão representadas junto às causas sociais, emitindo opiniões e reivindicando mudanças nos problemas das minorias.
No Brasil, o Estatuto da Mulher Casada (Lei n. 4.121/62), que foi um movimento das mulheres que ficavam reduzidas ao estado de relativamente incapazes e submetidas, assim, a uma curadoria do marido, contra o então vigente Código Civil de 1916, no qual a mulher casada era considerada incapaz do ponto de vista civil, o que só foi modificado em 1962, com a aprovação do Estatuto que equiparou os direitos dos cônjuges, e devolveu a plena capacidade à mulher casada, e resguardava agora os bens adquiridos com o fruto do seu trabalho, e ainda lhe assegurava o direito à propriedade de forma exclusiva.
Ainda sobre o Código Civil de 1916, fazendo uma exegese do referido dispositivo da Lei 3.071/16, é de se entender que o casamento era indissolúvel, no texto original do art. 315 apenas constavam três formas de término da sociedade conjugal: morte de um dos cônjuges; nulidade ou anulação do matrimônio; ou pelo desquite, judicial ou amigável, já que os desquitados não estavam liberados da relação jurídica criada pelo casamento, ou seja, não podiam casar-se novamente, assim, foi aprovada a Emenda Constitucional n. 9, em 28 de Junho de 1977, que outorgou nova redação ao § 1º do art. 175 da CF de 1967, que passou a dispor que " o casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos", regulamentado pela legislação infraconstitucional Lei n. 6.515/77 – Lei do Divórcio, que revogou os arts. 315 a 324 do CC 1916, o denominado desquite foi substituído pelo instituto da separação judicial ou de direito, a evolução por qual passou a sociedade, inclusive a família, impulsionou sucessivas transformações legislativas; o surgimento de novos paradigmas, a mudança na realidade do país, e a evolução dos costumes desencadearam uma mudança na própria estrutura social.
Após a superação de obstáculos ainda maiores ao desenvolvimento da igualdade e democracia a nível nacional e internacional, como, por exemplo, a jovem luta política contra a ditadura, a evolução do movimento feminista, defendendo, entre outros pontos, a efetiva e justa inserção das mulheres no mercado de trabalho, e a revolução sexual, o papel da mulher na sociedade, em geral, vem refletindo uma luta pela sua cidadania, que lhe foi negada desde os primórdios da civilização com raízes na evolução histórica da subvalorização da mulher, perpetuada nas sociedades patriarcais, em que o homem detinha o poder.
O cenário atual se mostra bastante diferente, principalmente no ordenamento jurídico, mas ainda requer muita atenção e cuidado, isso porque há ainda muita dificuldade da mulher atual em se declarar e sentir-se independente pela visão histórico cultural que ela tem de si mesma, causada por séculos e séculos de repressão masculina. Embora haja um processo de mudança de uma cultura machista para uma que defenda a igualdade de gêneros, ainda é muito restrito esse debate na sociedade, porque embora essa igualdade seja legalmente garantida, é muito lenta a transformação de uma mentalidade coletiva que sobreviveu durante tanto tempo.
Há em diversas esferas a crença que a mulher já ocupa uma posição igual a do homem, o que é uma inverdade, pois a discriminação se apresenta de forma maquiada. O que sobra então para reflexão, é que nenhuma mudança ocorrerá se não houver disposição e empenho de todas as pessoas para derrubar essa cultura opressora contra a mulher. Mulheres e homens devem ter consciência de que são sujeitos de direitos e que suas diferenças fazem parte de um modelo democrático em que se deve predominar a tolerância e o respeito às especificidades. Somente quando todas lutarem por essa igualdade ela realmente virá.